Parou o tempo, parou o espaço e todo o seu conteúdo. Parou a interação, paralisada no medo. Não foi um medo qualquer, foi o medo muito palpável de morrer. Só não morro, porque me quedo inerte, ainda que em alerta, atrás da barreira protetora que ergo à minha volta, munida de vasto arsenal para revidar ataques imaginários, tal como o bravo Dom Quixote que brandia a espada para dar cabo do inimigo que insistia em fantasiar-se de moinho de vento só para judiar e ludibriá-lo. E o seu fiel escudeiro, Sancho Pança, ainda que espantado, amparava-o na compaixão.
Houve um tempo, porém, – realidade paralela? – em que sabíamos que brincar nas poças de lama em meio a uma bela chuva misteriosamente nos fortalecia. Não era tão fácil resfriar-se ao pegar uma aragem, ainda que fosse normal gripar quando mudava a estação ou quando aflorava alguma emoção difícil de lidar. A ordem então era recolher-se, repousar para que o corpo pudesse eliminar o que não lhe servia mais, através das mucosas que se descongestionavam lentamente. Aprendíamos a lidar, mais, ou menos pacientes, com o desconforto, com algum sofrimento, de onde saíamos reequilibrados, as energias renovadas. Amadurecidos na aceitação da dor, imunizados.
Foi antes dos Atchim? Resprin!, soluções de gratificação imediata que nos roubaram a sabedoria da experiência do adoecer, aquela que faz a alma expandir-se e saber.
Os quadros descritos coexistem, ao lado de muitos outros, pois cada um de nós escolhe a realidade que deseja criar, ainda que tantos ainda não se deem conta desse seu poder, e o entreguem de bom grado a poderes que imaginam ter o poder de apoderar-se do seu destino, solucionando tão grave questão, essa possibilidade assustadora de perda e morte.
A morte é real nesta dimensão que nos parece tão real. Se com ela nos identificamos com exclusividade, o medo é inescapável. Nesse quadro, não sabemos de nós, seres infinitos que viemos passear nesta encarnação para aprender o que é a polarização; não nos damos conta que conseguimos até levá-la ao seu ápice. Atração e repulsão de campos eletromagnéticos, em constante reposicionamento, mentes em modo ataque e defesa. Cumprimos a nossa missão sem sequer conhecê-la porque perdemos a memória de que foi bem isso que viemos fazer aqui.
Se houver um só vislumbre desse elo perdido, da realidade dessa canção de pulsação e frequência dos sinais que estabelecem a conexão cósmica, podemos aquietar e olhar à nossa volta e escutar e acolher e perdoar e dar e receber perdão e compaixão, essa poção mágica que cura, tal como fazia o ingênuo Sancho Pança. Dissolve-se o medo visceral revertendo a qualidade do que secretamos no fluxo dos hormônios. Dopamina, serotonina, ocitocina, prazer, alegria e acolhimento, retornam ao seu rito original que é a criação da homeostase, que é o equilíbrio da saúde perfeita.